terça-feira, 17 de março de 2009

Educação e o fetichismo da tecnologia

O presente ano letivo na rede estadual de educação se iniciou sob o signo do fetichismo da tecnologia. Ao lado do PDE, o chamado PAC da educação, imposto pelo governo federal, que promete quantia em dinheiro às escolas e professores em contra-partida ao desenvolvimento de “projetos educativos”, o governo estadual faz da glorificação da tecnologia o centro de sua política educacional.

A instalação de microfones e alto-falantes nas salas de aula, assim como de um vasto sistema de informática que promete controlar a freqüência dos professores e alunos nas salas de aula (o chamado ponto eletrônico-digital), as notas e avaliações aplicadas aos estudantes, bem como a quantidade de alimentos consumidos por estes nas merendas formam um mirabolante e multimilionário projeto educacional que se complementa com a noção de “otimização” da rotina escolar.

O governo de Sérgio Cabral vale-se do tremendo peso social do fetichismo da tecnologia para tentar convencer a sociedade da razoabilidade do absurdo. A idéia de que a presente crise educacional, na qual se encontra mergulhado o estado do Rio de Janeiro, deve sua causa a um suposto atraso tecnológico é tão fácil, como falsa e interessada. É fácil porque se atrela a um senso comum cada vez mais bombardeado pelas noções que atribuem às inovações tecnológicas uma verdadeira onipotência.

É uma idéia falsa porque, na verdade, o centro da crise educacional se encontra na precarização do trabalho docente e no sucateamento das condições de ensino-aprendizagem. Enquanto o governo prepara-se para destinar muitos milhões de reais para a compra dos equipamentos a serem instalados em todas as salas de aula da rede estadual, os profissionais do ensino recebem um dos mais baixos salários do país, e os funcionários técnico-administrativos recebem um piso salarial bem abaixo do salário mínimo. Enquanto se pretende controlar digitalmente, com um computador em cada sala de aula, a freqüência dos alunos, grande parte das escolas se encontra em um estado físico calamitoso e as salas de aula se encontram cada vez mais inchadas, em grande parte dos casos ultrapassando o número de 50 alunos.

A Unesco (organismo das Nações Unidas para educação e cultura) afirma expressamente que uma sala de aula não pode contar com mais de 25 alunos para que o processo de ensino-aprendizagem aconteça de modo adequado, por outro lado, o governo Cabral obstaculiza a formação de turmas com menos de 35 alunos, de modo a não revelar a monstruosa carência de professores na rede, em função dos vergonhosos salários. Professores mal pagos tornam-se incapazes de promover sua formação continuada e precisam trabalhar em cinco, seis ou mais escolas para garantir uma renda aceitável, precarizando e superficializando, obviamente, sua relação educativa com os alunos.

Podemos dizer ainda que a idéia do fetichismo tecnológico transformada por Cabral em política educacional é uma idéia interessada porque as transferências de recursos públicos para o setor privado serão gigantescas. É importante que a sociedade e os poderes democráticos constituídos mantenham-se vigilantes em relação aos volumosos fluxos de dinheiro público que prometem verter em breve.


Artigo publicado na edição de hoje do jornal Monitor Campista

3 comentários:

Hilda Helena Raymundo Dias disse...

Muito oportuna a postagem diante do caos que se encontra a Educação pública não só no município,ou estado ,mas no país..

Todos esses projetos/propostas não guardaria, na sua essência, o propósito privatista, no caso do Rio de Janeiro , de forma disfarçada ???

Nos governos de Fernando Henrique Cardoso, a situação não foi diferente, suas ações constituíram-se em investidas de resgate das propostas dos governos anteriores, levando as IES públicas a se lançarem no terreno da concorrência de mercado, buscando recursos na iniciativa privada. Os resultados desse processo, além de não se reverterem em benefício da instituição, encaminharam-se no sentido de subordinarem as
escolas à lógica do capital privado e podem ser analisados a partir de duas óticas: gestão direta de uma rede de ensino responsável, e controle e direcionamento de parcela majoritária da pesquisa científica e tecnológica produzida no país.

Esse conjunto de ações e mudanças (algumas delas realizadas sub-repticiamente) evidencia, no fundo, a existência de uma política educacional tipicamente neoliberal, que retira da escola o seu caráter público, destituindo-a, portanto, de sua condição de instituição a serviço da população brasileira.

No entanto, o que aconteceu de fato foi que Fernando Henrique Cardoso não cumpriu nem a lei que ele próprio elaborou (9424/96 - FUNDEF) e nem o que foi identificado como gasto com a educação é verdadeiro como, por exemplo, atendimentos hospitalares, aposentadorias, pesquisas científicas e tecnológicas, prestações de serviços, entre outros, são itens, arbitrariamente, incluídos como gastos em educação.

Além disso, o que realmente aconteceu foi uma redução de recursos vinculados à educação, a partir da implementação da denominada DRU; que permite desvincular da área social 20% do orçamento da União para o governo gastar livremente, sobretudo para elevar o superávit e garantir o pagamento dos serviços da dívida pública.

Dessa política, resultaram déficits educacionais em todos os níveis e modalidade de ensino; salários e condições de trabalho aviltados; falta de materiais e equipamentos; déficit de pessoal docente e técnico-administrativo, com conseqüente precarização do atendimento educacional público em todo o país.

Além disso, os programas de redistribuição de renda ou de garantia de renda-mínima e outras ações que têm referência no conceito de gratuidade ativa (como programas de bolsa-escola ou outros tipos de bolsas), com vista a corrigir as condições que inviabilizam o acesso e a permanência de estudantes nas escolas , devem ser custeados com recursos adicionais aos definidos para a manutenção e desenvolvimento do ensino.

A construção de uma escola pública, na acepção plena da expressão, exige como precondição a garantia de recursos públicos para o seu financiamento. Ainda que pareça desnecessário, é importante que esteja claro o significado de recursos públicos... aqueles que são arrecadados pelo Estado, por meio do sistema tributário e de outros instrumentos democraticamente estabelecidos que estejam de forma transparente previstos e explicitados nos orçamentos públicos e que, finalmente, no processo de planejamento e de execução orçamentária, sejam destinados ao atendimento das prioridades sociais que correspondam às reais necessidades da maioria da população.

A educação é dever do Estado, razão pela qual a sustentação da escola é compromisso fundamental do poder público. Quaisquer tentativas de encontrar formas paralelas de garantir essa sustentação representam, em última instância, esquemas disfarçados de privatização.

Assim, a luta pela transformação da escola brasileira em instrumento de construção de uma sociedade independente e soberana, do ponto de vista cientifico, tecnológico e cultural, exige, no que diz respeito ao seu financiamento, a fixação de dois pressupostos básicos:
*Garantir o atendimento pleno das demandas sociais por educação, em todos os níveis, mediante o ensino público e gratuito;

*Ser autônoma e democrática, oferecer ensino, pesquisa e extensão de serviços à comunidade, por meio de sua organização, a partir de um padrão unitário de qualidade, referenciado na estrutura da escola pública.

Maycon Bezerra disse...

Cara colega, concordo em gênero, número e grau. Apareça sempre por aqui. Um abração!

Monica disse...

Maycon,
Obrigada pelo apoio no blog do Xacal! Sua opinião é importante para mim!!!
Um abraço