terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Carta aberta de Gaudêncio Frigotto e Carmen Lozza

Divulgo abaixo a carta aberta redigida por estes dois importantes pesquisadores da questão educacional brasileira em crítica à nomeação da senhora Claudia Costin para a secretaria de educação da cidade do Rio de Janeiro. Claudia Costin é uma figura central no interior dos setores político-intelectuais vinculados com o neoliberalismo ''puro-sangue" do tucanato e do Instituto Millenium (uma "elite orgânica" que agrupa os mais importantes empresários, tecno-empresários e intelectuais da direita neoliberal do país) . Deixo claro que também é o repúdio deste o blog o repúdio de Gaudêncio e Carmen


2009 e a Educação na cidade – uma indicação e três equívocos


A escolha da futura secretária de Educação do município do Rio de Janeiro, pelo prefeito recém eleito, em nosso ponto de vista traz pelo menos três equívocos sobre os quais propomos uma reflexão pausada, ampla e pública.

Antes de enunciá-los, contudo, queremos descartar qualquer impressão de que o que aqui vamos expor possa ser confundido com imaturos "choramingos de perdedores" ou com um desqualificado lamento bairrista, em função da importação de São Paulo da futura secretária; tampouco com qualquer questão pessoal em relação a ela, pessoa a quem, até onde se sabe, foram entregues importantes missões no serviço público, em relação às quais saiu-se conforme o esperado por seus superiores.

O problema que está na base da indicação de agora reside no fato de que o que o Prefeito pode estar esperando da futura secretária parece não ser o que dela possam aguardar os integrantes da Rede Municipal, sejam eles professores, alunos, pais ou funcionários. Talvez alguns, sim, mas a expressiva maioria, não.
Do que passamos a tratar é da inadequação da Sra. Claudia Costin ao que é urgente, inadiável mesmo, para a qualificação social da Rede Pública Municipal da capital. Fosse um casamento (fazendo uma alegoria), estaríamos caminhando para uma possível anulação por "erro de pessoa", tamanha a distância entre a natureza da Rede e suas necessidades e aquela que a conduzirá a partir de janeiro. O perfil acadêmico-profission al da Sra. Claudia poderá perturbar gravemente os resultados de seu trabalho à frente da Educação da cidade do Rio de Janeiro. Nesse suposto casamento, portanto, "erro de pessoa" do ponto de vista da Educação da capital.

Explicamos nosso ponto de vista.
O primeiro equívoco que a indicação traz junto a si é a clara orientação privatista que impregna a indicação do Sr. Eduardo Paes, dado o perfil e trajetória profissional da futura secretária, ícone, como ministra do Governo Fernando Henrique Cardoso, da reforma do Estado, cuja carreira traz a marca da fidelidade aos interesses do mercado, o que pode acentuar o caráter excludente de nossa rede pública de escolas. E isso num momento em que o mercado internacional, por sua própria lógica interna, vem sofrendo os revezes da orientação neo-liberal que marcou a economia nas últimas décadas, com os perversos reflexos para a educação realizada entre nós. Os mais importantes defensores e propaladores do livre mercado estão fazendo o mea culpa publicamente. Parece ser, então, inadequada ao atual momento histórico a escolha do Prefeito. Até mesmo démodé, diríamos.

Quanto ao segundo equívoco a que nos referimos, este tem a ver com a distância da formação e prática culturais que envolvem, de um lado, a convidada, ao longo de sua vida – paulista, atuando sempre em seu estado natal, em Brasília (quando Ministra no MARE) e mesmo fora do Brasil, no Banco Mundial – e, de outro, o Rio de Janeiro, cidade cujas escolas de formação ofereceram à cidade, desde sempre, educadores bem formados e conhecedores da realidade municipal. Quanto a esse aspecto, não se pode negar o quanto a postura do Prefeito tenta esvaziar a história da cidade e de seus profissionais. Nenhum educador carioca, parido e criado dentro das mazelas e conquistas da educação que aqui se pratica, estaria apto para o cargo? Por quê (é o caso de se indagar)?

Ou, e aqui vem o terceiro equívoco, ou, repetimos, o que conta para o Sr. Eduardo Paes são as alianças, estabelecidas desde já para futuros pleitos eletivos, para os quais é condição a costura de alianças em âmbito nacional, que, dentre outros, junte tucanos de variadas plumagens, para garantir acordos em prol de desejos pessoais a serem realizados mais adiante? O terceiro equívoco, pois, é este: o de imaginar que não sabemos interpretar os fatos para além dos interesses intestinos do agora, imediato e pouco translúcido a olho nu (ou ingênuo). É um erro, com efeitos devastadores em relação ao que virá. Até mesmo antes das eleições de 2010).

Desse modo, se para o projeto político do grupo do "novo" prefeito, a indicação da Sra. Claudia vem a calhar (como um "Exterminador do Futuro", possuidor de todo o instrumental e técnica para dar cabo da missão), ao contrário, diante de tal fato e considerando a urgentísisma necessidade de requalificação da Rede Municipal de Educação do Rio, na perspectiva de uma escola para todos e para cada um, estamos longe de poder ter boas expectativas.

Com maioria tão estreita a seu favor, o Sr.. Eduardo Paes deveria repensar este seu equívoco de agora. Afinal de contas, Educação não é moeda de troca e o Rio não precisa de experimentalismos que construam mais um tempo de fracassos. O Rio, sim, precisa de uma política clara, em favor da Educação Pública. Isso, acreditamos, foge ao que a futura secretária pode oferecer à cidade. O caráter dualista da escola, a culpabilização do Magistério pelo fracasso do ensino, a naturalização quanto ao fato da escola deixar a maioria pelo caminho, e tudo o mais que vem incorporado à política educacional que os reformadores do estado promovem, antes mesmo da posse nós já conhecemos. A partir desse discurso e prática não se produz a educação que estamos a dever aos filhos desta cidade! .


Carmen Lozza e Gaudêncio Frigotto

Um comentário:

Anônimo disse...

http://diariodoprofessor.com/2008/11/30/carta-aberta-a-futura-secretaria-de-educacao-do-rio-de-janeiro-claudia-costin/